sábado, 4 de janeiro de 2020

Menina-flor


“Você é muito bonita!”, nunca ninguém disse à minha criança.

Já crescida, adulta, vivida, ouvi: Que mulher linda!

Mas a lacuna, menina, lá ficou sem sequer esperança.

Difícil agora escutar, acreditar neste lugar,

pois o olhar para a menina sempre quer voltar.

Como fazer brilhar a criança que ninguém quis conquistar?

A mulher que sou precisa regar aquela menininha-flor.

Ah, e se eu transbordar de amor? Será que alcançarei sua dor?
Vale a pena tentar, seja como for!

Olhos da´água




Dizem que tenho olhos de água. Acho que é porque choro as lágrimas que minha mãe não chorou.

Falam que minha voz é embargada. Acho que é porque guardo o pranto que minha avó não pranteou.

Linhagem de mulheres fortes, de ação. Sofrimento foi inominável, não restando tempo ou energia para gastar com lamentação.

Era preciso sobreviver e labutar. Por elas e pelos filhos, sozinhas, contra o mundo, lutar.

Sou o que elas não puderam ser: lamento e prazer.

O legado de dor represada fez em mim morada.

Tudo bem, minhas amadas. Sou forte também.

Mas de uma fortaleza que desagua!