As angústias da adolescência estão em um passado bem
distante, quando a insatisfação com o corpo extremamente magro era dilacerante
e o coração parecia estar exposto a todas as agruras da vida.
As incertezas da juventude há muito que se foram,
quando me punha a pensar o que seria de mim, onde e como estaria dali a dez
anos. O futuro – se chegasse! – me parecia um lugar escuro e assustador, visto
que não estava nem um pouco satisfeita com o presente e não via, para onde quer
que olhasse, perspectiva de mudança, sabendo que não suportaria por muito tempo
aquela existência, até ali, de sacrifício e luta sem esperança. Sabia que a
vida podia ser diferente; só não sabia como conseguir chegar lá. Estudar? Sim,
estudava e muito. Trabalhar? Sim, trabalhava. Tentei, inclusive, dois empregos.
O que não contribuiu nem um pouco para a mudança de meu corpo que continuava
dez quilos abaixo do que seria normal em minha idade; não podia, sequer, doar
sangue.
Muitos anos depois, me vejo, finalmente, lá! Naquele
lugar que sabia existir: um bom emprego, uma casa confortável, num bairro
decentemente abastecido das comodidades a que todos deveriam ter direito –
condução adequada (quatorze minutos de metrô até o trabalho, no Centro),
supermercados a cinco minutos de caminhada, farmácia e hortifrúti em frente ao portão,
faxineira uma vez por semana.
E é quando os médicos começam a me mandar caminhar,
fazer exercício, sabe, talvez saltar uma ou duas estações de metrô antes de
casa, para – pasmem! – perder peso!
_ Como assim?!?
Quando foi que engordei tanto? Não me dei conta!
E o médico disse:
_ Pois agradeça
a seu corpo. Ele fez isso para protegê-la do mundo. Se você tivesse continuado
magra, não teria sobrevivido a tudo pelo que precisou passar.
Lágrimas de compreensão e agradecimento vazaram por
mim, enquanto eu fazia uma prece:
_ Querido corpo, sou
grata, por você ter engordado. Compreendo e agradeço por você ter feito isso
para nos proteger; para que pudéssemos viver.
Mas, agora, não é mais
necessário. Estamos bem; vamos ficar bem; a vida já é boa; nada mais nos
aflige; aquela luta terminou. Chegamos! Vencemos!
Sou muito agradecida a
você, amado invólucro de minha alma!